Quando o amor é um crime

Freud nos diz “Amaremos aquilo que fomos e deixamos de ser, ou aquilo que possui qualidades que nunca teremos”.

A escolha não é sobre o outro, a escolha é sobre nós e sobre o que o outro nos desperta, consciente ou inconscientemente. Compreender o que o outro nos causa é importante e indispensável. As relações são trocas, e nem sempre conseguimos nos envolver em relações que geram trocas positivas e válidas. E se movimentar frente a essa compreensão, exige coragem e amor, auto amor.

O outro pode nos despertar motivação, esperança e vitalidade. Mas podemos entrar em relações que se conectam diretamente às partes sombrias do nosso ser. Não se engane, todos temos. Essa conexão não é vista e nem sempre é sentida com clareza, mas podemos reconhecer essa conexão negativa quando me mantenho em uma relação destrutiva. Isso foge do que é saudável. Não dizemos correto.

Mas repito, saudável. Comportamentos destrutivos, são aqueles que fazem com que você permaneça em lugares, sejam eles físicos ou emocionais, que te adoecem, te distanciam do que antes era realmente importante pra você, lugares que fazem você duvidar da sua sanidade, te causam insegurança, desesperança e de todas ou mesmo que de poucas formas, te destroem.

Quando dizemos sobre essa parte sombria, falamos sobre traumas, perdas, medos e qualquer outra coisa que tenha lhe causado dor, que não foi reparado e que você carregou gerando assim cicatrizes, quase que invisíveis e que em algum momento, quando afetada, pode trazer a sensação de pertencimento, não por ser bom, mas por ser seu e quando vista, de alguma forma, gera a sensação de que pode ser mudada. Uma falsa sensação. Pois essas dores, não precisam de substitutos, elas precisam de cuidado, de escuta e de compreensão.  

Compreender tudo isso é importante e pode fazer com que relações ruins se findam mais cedo. Mas ainda não nos priva de ser vista pelo outro como um objeto totalmente pertencente a ele, sem escolhas, sem passado, sem futuro, sem individualidade. Somente um objeto que foi criado para agrada-lo e satisfaze-lo. E por nos colocar como o centro, algo quase místico que foi criado totalmente para ele, ele acredita então que é dono e que por ter autoridade, tem liberdade para fazer o que o seu ego determinar.

O amor é crime quando ele se torna posse. Eu poderia usar as aspas na palavra amor, mas escolhi assim não as usar, pensando que quem o detém, acredita cegamente ser amor e tudo gira em torno do que ele acredita. É assustador e de alguma forma hilário pensar que o autor de um amor obsessivo, acredita amar tanto o outro, mas vê somente a si e a seu próprio desejo.

O outro passa a ser apenas quem realiza o seu desejo e muitas vezes o que ele mais quer é que o outro o ame da mesma forma, cega e obsessiva. A frustração que mais machuca é ouvir o não, é o não satisfazer, é quebrar o que ele mesmo criou, é frustrar o ego de alguém que achou que ele também era o centro. E dentro da frustração só há o desejo de tomar o controle daquela vida novamente pra si, mesmo que o fim seja trágico. Esse amor, sempre foi cego e, para o amor obsessivo o que mais importa é ter pra si, de qualquer forma, o “seu” objeto.

Há formas de não se envolver profundamente em relações de controle excessivo, mas muitas vezes esse amor exagerado não é mostrado logo no início, por isso é tão importante se perceber dentro das relações e mais ou tão importante quanto isso é se conhecer, cuidar das feridas abertas e dos traumas que o seu caminho pode ter deixado, impedindo assim que a sua mente encontre falsos substitutos para esses supostos vazios emocionais.

O amor não tem um formato. Não existe um guia para o amor saudável e não há um jeito certo ou errado para viver o amor nas relações. Mas dentro de toda relação deve conter características importantes como respeito, reciprocidade, lealdade .. e outras coisas que são indispensáveis para cada um dentro de uma relação, não abra mão do que é importante pra você.

De tudo que o amor é, ele também não pode ser várias coisas. Ao amar corremos o risco de perder. Ao amar nos envolvemos com diferenças muitas vezes gritantes. Ao amar damos de cara com aquilo que eu não gosto em mim e se reflete no outro. O amor não deixa de doer por ser amor.

A diferença é que essa dor é uma construção, nela há acolhimento, respeito, compreensão e carinho. Quando o amor que você vive invade quem você é, te faz sentir como se estivesse na corda bamba, sem segurança alguma e ao mesmo tempo, em um campo de batalha, onde a qualquer momento você corre o risco de pisar em uma bomba e tudo explodir, procure a saída desse campo minado.

O amor não te ataca, isso acontece quando o amor é um crime.  

Maria Emília Campos

Maria Emília Campos

“ Maria Emília Oliveira Campos. Uma mineira vivendo no interior de São Paulo. Psicóloga Clínica há 6 anos. Amo falar sobre relações; relação com o mundo, com o outro e consigo mesmo. Sou apaixonada pela mente humana e pelas incríveis e assustadoras capacidades que ela tem. E venho aqui compartilhar um pouco do pouco que eu sei, para que juntas possamos ser muito.”

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