A mulher ocupa um lugar importante – mas nem sempre reconhecido – em todos os aspectos da evolução e do desenvolvimento da humanidade.
Na psicologia, o papel da mulher não é diferente. É expressiva a sua contribuição e o quanto mulheres de diferentes épocas e nacionalidades se dedicaram ao estudo da mente e do comportamento humano. Muitas delas expandiram ou mesmo criaram novas teorias apesar de enfrentarem inúmeros obstáculos e dificuldades pelo simples fato de serem mulheres.
Suas lutas iam além das dificuldades impostas pelo fazer, alcançando esferas do preconceito e da discriminação. A maioria delas enfrentaram obstáculos e tinham o seu acesso dificultado às universidades e ao mercado de trabalho.
Mas o fato é que essas mulheres não se intimidaram e resistiram, foram a luta por conhecimento e espalharam esse conhecimento de modo que ele nos alcança e nos beneficiam até hoje, como uma voz que ecoa.
São inúmeras as mulheres que traçaram a história e mudaram o rumo da psicologia, juntas representam aproximadamente 85% dos profissionais que atuam com a psicologia no Brasil. Atualmente, de acordo com o Conselho Federal de Psicologia (CFP), 9 entre 10 profissionais da área são mulheres
Vejamos algumas dessas mulheres:
Mary Whiton Calkins 1863
Psicóloga, psiquiatra e professora norte-americana nascida em 1863, em Hartford. Em 1885, formou-se pelo Smith College e, em 1887, começou a lecionar Grego.
Após três anos no Departamento de Grego, foi aconselhada a seguir um programa experimental de psicologia onde foi admitida no Laboratório de Psicologia da Universidade de Harvard, onde a entrada de estudantes mulheres era proibida.
A Universidade de Harvard se recusou várias vezes a atribuir-lhe o doutoramento, simplesmente por ser mulher.
Em 1891, criou o laboratório experimental de psicologia onde se tornou professora dessa ciência. Em 1905, foi a primeira mulher a ocupar o cargo de Presidente da Associação Americana de Psicologia, sem ter doutoramento.
Mary Calkins interessou-se pelo conceito do self e realizou também estudos sobre a memória humana, desenvolvendo o método “paired-associate” (associar os pares) para estudar as memórias verbais e descobriu que a repetição dos pares aumentava a retenção de palavras.
Melanie Klein 1882
Melanie Klein, foi uma psicanalista austríaca e é classificada como uma psicoterapeuta pós-freudiana.
Em 1916, em Budapeste, teve o primeiro contato com a obra de Sigmund Freud e foi estimulada a iniciar o atendimento a crianças.
Em 1919 tornou-se membro da Sociedade de Psicanálise de Budapeste, no ano seguinte conheceu Freud e Karl Abraham e foi convidada a trabalhar em Berlim.
A partir de 1923, passou a dedicar-se integralmente à Psicanálise e em 1924, no VIII Congresso Internacional de Psicanálise, Klein apresentou o trabalho: A técnica da análise de crianças pequenas.
Em 1927, Anna Freud publicou o livro: O tratamento psicanalítico de crianças e Melanie criticou suas idéias, dando início a um subgrupo kleiniano na Sociedade Britânica de Psicanálise. No mesmo ano tornou-se membro da Sociedade.
Em 1932 publicou a obra A psicanálise da criança, simultanemante em 1936 realizou conferência sobre O desmame; em 1937 publicou Amor, ódio e reparação, com Joan Rivière; entre 1942 e 1944 elaborou, com discípulos, a sua teoria.
Em 1947, aos 65 anos, publicou Contribuições à psicanálise.
Em 1955 foi fundada a Fundação Melanie Klein.
Em 1960 foi operada de um câncer do cólon. Morreu aos 78 anos de idade.
Anna Freud 1895
Anna Freud era a caçula de 6 filhos de Sigmund Freud. Pedagoga de formação, exerceu essa profissão nos anos de 1914 a 1920. E por um curto período de tempo foi professora infantil, e logo se juntou ao circulo de discípulos de Freud, e então se tornou Psicanalista, com o seu tratamento voltado para crianças, sendo a pioneira nesta área, e estabeleceu clínicas e berçários para crianças que eram vitimas da guerra, sobreviventes do holocausto, ou que estavam sendo atormentadas pelas suas vidas.
Na área da analise infantil Anna Freud aprofundou-se definitivamente ao tratamento psicanalítico de crianças, considerada sua obra principal.
Annita de Castilho e Marcondes Cabral 1911
Idealizadora e fundadora do Curso de Psicologia na USP, em 1953.
O curso começou a ser desenhado com a criação de linhas de pesquisa o que se deu em um ambiente hostil, pelo fato de haver uma mulher chefiando o grupo de pesquisa e também pelo fato de a Cadeira de Psicologia pertencer ao Curso de Filosofia cujas disciplinas não possuíam um perfil nos moldes da ciência de então.
A criação efetiva do curso se deu apenas em 1957.
Foi responsável pela criação da Especialização em Psicologia Clínica.
Junto de outros profissionais da área de psicologia, criou um anteprojeto de criação dos Cursos de Psicologia e da Regulamentação da Profissão de Psicólogos, encaminhado ao Ministério da Educação (MEC) em novembro de 1953.
Depois de várias idas e vindas do projeto, foi promulgada a a Lei 4.119 de 27 de agosto de 1962, que regulamentou a profissão de psicólogo e criou cursos de Psicologia em várias universidades do país.
Annita afastou-se da universidade em 1970 e faleceu em 1991, em São Paulo.
Madre Cristina Sodré Doria 1916
Nascida Célia Sodré Dória, religiosa da Congregação de Nossa Senhora, cresceu entre discussões políticas e o aprendizado cristão de respeito e disponibilidade para com o próximo. Formou-se professora e veio para a capital fazer faculdade (1937-1940). Entrou para a vida religiosa e começou a lecionar para os universitários. Estudou Freud sozinha e mais tarde foi para o exterior complementar os estudos em psicologia.
Frequentou a Sorbonne, e em 1954 doutorou-se em Psicologia, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).
Proferiu palestras para estudantes, pais e professores. Devido a seu empenho juntamente com outros profissionais, foram criados pelo MEC os cursos de psicologia no Brasil.
Foi chamada de comunista, radical e recebia ameaças de morte e de prisão.
Fundou o Instituto Sedes Sapientiae (1977) que define “como um espaço aberto aos que quiserem estudar e praticar um projeto para a transformação da sociedade, visando atingir um mundo onde a justiça social seja a grande lei”. Faleceu no dia 26/11/97.
Carolina Martuscelli Bori 1924
Liderou várias campanhas sobre o exercício profissional do psicólogo e foi o registro numero 1 no conselho da categoria, por ser a única mulher dentre os constituintes. Batalhou pelo currículo mínimo para a graduação e pela implantação do curso de pós-graduação em Psicologia. Presidiu e participou de inúmeras comissões para criação de cursos de Psicologia e de pós-graduação em todo o país.
Como uma das poucos doutoras em Psicologia nos anos 60 e como professora em cursos de pós-graduação, Carolina orientou mais de cem teses e dissertações.
O nome de Carolina está ligado a associações como a Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e, antes disso a Associação de Psicologia de São Paulo. Foi presidente de todas elas e membro atuante, mesmo que não estivesse participando diretamente da diretoria.
Participou das lutas para o desenvolvimento da Psicologia e Ciência no Brasil, convivendo com cientistas de várias ciências no Conselho da SBPC, Carolina tinha uma visão sobre como a Psicologia deveria trabalhar para ganhar respeito de outras áreas do saber e auxiliar a sociedade em geral.
Nise da Silveira (1905 – 1999)
Embora Nise da Silveira fosse formada em psiquiatria, ela colaborou significativamente para a psicologia brasileira em uma época dominada por tratamentos agressivos e desrespeito com pacientes de transtornos mentias.
Ela se opôs a métodos que julgava inapropriados, como o confinamento em hospitais psiquiátricos, eletrochoque, camisas de força e lobotomia. Então, implementou técnicas lúdicas no tratamento de pacientes esquizofrênicos, permitindo que se expressassem através da pintura e do desenho.
Nise posteriormente reuniu os trabalhos no Museu de Imagens do Inconsciente, recebendo destaque internacional. Em 1957, os quadros dos pacientes foram expostos no II Congresso Internacional de Psiquiatra, em uma exposição inaugurada por Carl Jung, um dos maiores estudiosos da psique humana.
Nise enxergava o valor de tratamentos terapêuticos aliados à psiquiatria. Por isso, também introduziu a interação com animais domésticos no tratamento de transtornos mentais. Os pacientes cuidavam dos cachorros que habitavam no pátio do hospital.
Essas são apenas algumas das muitas contribuições dessas grandes mulheres para o estudo da psique, da mente e do comportamento humano.
Fato é que sempre ouvimos a história do mundo através das vozes de grandes homens, mas a história do mundo é grande demais para se ter uma só perspectiva, uma só voz. Esse artigo vem mostrando que elas existem: as cientistas, as inventoras, as psicólogas e as psiquiatras.
Embora por muito tempo elas tenham sido convenientemente deixadas de lado, hoje trouxemos ao seu conhecimento algumas dessas grandes mulheres da psicologia e psiquiatria, mulheres que inspiram.
Com carinho,
Fátima Aquino
Psicóloga Clínica