Foram muitas décadas de exploração de pessoas pretas no Brasil, usadas como mão de obra de trabalho forçado. A escravidão forjou historicamente nosso país, e tornou o racismo um fenômeno que atravessa gerações e influencia ainda hoje a atuação, inclusive do Estado.
O Brasil é um país com grande número de pessoas pretas e mestiças e possui uma imensa diversidade étnica e cultural. Desde a colonização, o país recebe milhares de imigrantes até hoje. Esse caldeirão cultural promoveu uma vasta riqueza de contribuições que repercutem na sociedade diariamente.
O racismo no Brasil é um problema histórico e social e está presente não apenas no preconceito de cor, mas nas relações hierárquicas, de gênero, econômicas, sobrevivendo desde o período colonial até hoje. A desigualdade social tem cor, e as vítimas de preconceito racial, sofrem todos os dias em diversas situações, seja nas ruas, nas escolas, no trabalho, nas relações sociais.
Lidar com o sofrimento psíquico causado pelo racismo e também pelo machismo é um desafio cotidiano para mulheres pretas. Diagnósticos como depressão, ansiedade, síndrome do pânico, ideações suicidas aparecem entre os casos e podem ser observados como efeitos do sofrimento racial. Na área profissional, essas mulheres ainda precisam manejar situações levando esses marcadores de diferença em consideração, o que acrescenta ainda mais dificuldades e sofrimento ao processo.
Desde os tempos de vigência da escravidão, a figura da mulher negra esteve associada com duas coisas: ao prazer sexual e ao cuidado com as crianças. Com freqüência, os senhores de engenho obrigavam as escravas a manterem relações sem consentimento para depois dispensá-las como um mero objeto. Elas só não eram desprezadas totalmente por causa da função de amamentar as crianças e alimentar os demais.
O legado disso é a máxima equivocada de que “mulheres pretas são fortes” e por isso suportam tudo em silencio. Esse conceito continua a incentivar os casos de violência e abusos de todo tipo, cometidos contra elas. A hipersexualização de mulheres pretas, bem como a idéia associada de “mulher forte”, são estereótipos sociais que propiciam enorme sofrimento em mulheres pretas.
Todo esse contexto de abusos e exclusão de direitos provoca impactos em diversas áreas
da vida delas e não seria diferente com a saúde mental, que também sofre com as consequências do racismo, sendo ele um dos mais importantes geradores de sofrimento psíquico, agravando em muito a saúde mental dessa população.
Sofrimentos psíquicos e físicos advindos do racismo se manifestam nessas mulheres em forma de crises de ansiedade, ataques de pânico, depressão, sentimento de culpa, vergonha, descredito e baixa autoestima.
Quando se trata das mulheres pretas, todas essas dificuldades podem comprometer a autoestima e serem causadoras de um sentimento de solidão e como consequências do que costuma acontecer nesses traumas, estão os transtornos mentais, as fobias, o estresse, e o complexo de inferioridade.
A psicologia vem dedicando sua atenção em tratamentos de redução de danos, acolhimento e cuidado dessas mulheres, observando as varias consequências deixadas no campo emocional delas, analisando os traumas causados pelo preconceito no intuito de elaborar procedimentos para atender casos de racismo e adoecimento mental.
De modo geral, as pessoas buscam psicoterapia para elaborar questões relacionadas à relacionamentos amorosos, ao trabalho, a doenças, a acontecimentos graves e as relações familiares. Com a população negra isso não é diferente, acrescentando-se a isso, queixas raciais que são transversais a todas essas esferas da vida e acabam sendo subestimadas ou tratadas de forma a desconsiderar o aspecto histórico. A Psicologia deve estar atenta e comprometida para que isso não ocorra.
Os psicólogos precisam lidar com a questão racial em varias vertentes, por exemplo, realizando movimentos de acolhimento das vítimas, de concientizacao da população como um todo, contribuindo para elevar a autoestima dessas vitimas e reduzindo o desconforto o máximo possível.
É claro que, o tratamento terapêutico das ansiedades, dos estados depressivos e do estresse devem ser administrados também com terapias que ajudem a desestigmatizar a relação do racismo internalizado com a busca por seus direitos. Neste sentido, a psicoterapia atua também, na prevenção e redução de danos causados pela discriminação racial.
Nos atendimentos, a maioria das situações provenientes de racismo, demonstram que deve-se exercer a psicoeducação sobre direitos, para que se possa agir de forma assertiva, intervindo e ajudando a promover um melhor entendimento sobre a questão do racismo e saúde mental da mulher preta.
A questão central da psicologia, no cuidado para com as mulheres pretas, deve levar em conta o fato de que, por ser uma ciência, ética e política, deve trabalhar para contribuir no reconhecimento e legitimação desses sofrimentos, enquanto estratégias de cuidado antirracistas e antimachistas.
Claro que isso ainda é um despertar, o inicio do processo, uma fagulha que precisa “acender” a chama em cada os profissionais de saúde, nas autoridades, na políticas publicas e na população geral. E o caminho para que isso aconteça de modo efetivo ainda é longo.